Revista Sísifo. N° 13, Janeiro/Junho 2021. ISSN 2359-3121. www.revistasisifo.com
Natália Pereira Ribeiro da Silva
Graduada em Bacharelado em Filosofia pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Mestranda no programa de Pós-Graduação do Departamento de Filosofia (DFil) da UFSCar. E-mail: ser.naty@hotmail.com
Resumo
Chantal Mouffe, sob a influência da filosofia política de Carl Schmitt, desenvolve sua teoria afirmando o antagonismo e o conflito como categorias centrais e essenciais do político. Mouffe traz à tona a reflexão acerca do papel central da relação “amigo-inimigo” na política, o que evidencia a dimensão do político como intrinsecamente ligada à existência de um elemento de hostilidade entre os seres humanos. Em sua obra Teologia Política, Carl Schmitt atrela a necessidade do político em decorrência da própria condição humana. Para o pensador alemão, toda ideia política toma de certa forma uma posição sobre a natureza do homem, e Schmitt não hesita em defender a tese de que o homem é “mau por natureza”, o que corrobora o caráter conflituoso da natureza humana. Mouffe reformulará essa ideia no enquadramento da crítica contemporânea do essencialismo, sob o viés de uma abordagem teórica da democracia pluralista, analisando que, se considerarmos que todas as identidades são relacionais e que a condição de existência de qualquer identidade é a afirmação de uma diferença, a determinação de um “outro” que desempenhará o papel do elemento externo constitutivo, será possível compreender a forma como surgem os antagonismos.
Palavras-chaves: Mouffe; Schmitt; Antropologia; Antagonismo; Agonismo; Paixões.
Anthropological
Aspect of the Concept of the Politician in Carl Schmitt and
Chantal
Mouffe
Abstract
Chantal Mouffe, under the influence of Carl Schmitt's political philosophy, develops her theory by affirming antagonism and conflict as milestones of the political figure. Mouffe brings up the reflection on the central role of the “friend-enemy” relationship in politics, which highlights the dimension of the political as intrinsically linked to the existence of an element of hostility among human beings. In his work Political Theology, Carl Schmitt ties the need for the politicial due to his own human condition. For the German thinker, every political idea takes a position on the nature of man, and Schmitt does not hesitate to defend the thesis that man it is "bad by nature", which corroborates with the conflicting character of human nature. Mouffe will reformulate this idea within the framework of essentialism's contemporary criticism, taking into account a theoretical approach to pluralist democracy, analyzing that, if we consider that all identities are relational and that the condition of existence of any identity is the affirmation of a difference, the determination of an “other” that will play the role of the external constitutive element, it will be possible to understand how antagonisms arises.
Keywords: Mouffe; Schmitt; Anthropology; Antagonism; Agonism; Passions.
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Introdução
O elemento de verdade [...] que as pessoas estão tão dispostas a repudiar, é que os homens não são criaturas gentis que desejam ser amadas e que, no máximo, podem defender-se quando atacadas; pelo contrário, são criaturas entre cujos dotes instintivos deve-se levar em conta uma poderosa cota de agressividade. Em resultado disso, o seu próximo é, para eles [...] alguém que os tenta a satisfazer sobre ele a sua agressividade, a explorar sua capacidade de trabalho sem compensação, utilizá-lo sexualmente sem o seu consentimento, apoderar-se de suas posses, humilhá-lo, causar-lhe sofrimento, torturá-lo e matá-lo. - Homo homini lupus. Quem, em face de toda a sua experiência da vida e da história, terá coragem de discutir essa asserção? Via de regra, essa cruel agressividade espera por alguma provocação ou se coloca a serviço de algum outro intuito, cujo objetivo também poderia ter sido alcançado por medidas mais brandas. Em circunstâncias que lhe são favoráveis, quando as forças mentais contrárias que normalmente a inibem se encontram fora de ação, ela também se manifesta espontaneamente e revela o homem como uma besta selvagem, a quem a consideração para com sua própria espécie é algo estranho. (FREUD, 1996, p.133)
Tanto sob o viés da teoria psicanalítica, que reconhece a existência de uma propensão à agressão devido uma hostilidade primária entre os homens, quanto da teoria política de pensadores que destacam a dimensão política da existência humana e adotam o pressuposto antropológico de que o homem é “mau”, ou seja, consideram-no como um ser dinâmico e “perigoso”, é possível constatar que a vida em sociedade não é, definitivamente o âmbito da paz plena, que possibilita gozar de uma convivência inteiramente harmoniosa e livre de conflitos. O pensador político Carl Schmitt, em sua obra O conceito do Político, afirma que todas as “autênticas” teorias políticas pressupõem a opção antropológica de que o homem é um ser naturalmente perigoso, como é o caso das teorias de Maquiavel, Hobbes, Bossuet, Fichte, de Maistre, Donoso Cortés, H, Taine e até mesmo Hegel (SCHMITT, 1992). Independentemente das diferenças, importância e relevância histórica dessas teorias, na concepção problemática da natureza humana, todas estão de acordo na medida em que se mostram como teorias especificamente preocupadas com o caráter político.
Encarar a política como um processo racional de negociação entre indivíduos é obliterar toda a dimensão de poder e antagonismo – aquilo a que chamo «o político» – e falhar, assim, a sua natureza. É também negligenciar o papel predominante das paixões como forças impulsionadoras da conduta humana. (MOUFFE, 1996, p. 186)
Em meio ao cenário político contemporâneo, diariamente assolado por conflitos étnicos, religiosos e nacionalistas, a política democrática se encontra em uma crise de eficácia e legitimidade. A pensadora política Chantal Mouffe se propõe então a refletir sobre o político e o caráter inerradicável do poder e do antagonismo, com o intuito de demonstrar que a democracia liberal tem sido incapaz de compreender estas questões em virtude da sua equivocada e essencialista concepção de política. Mouffe (1996), em contrapartida, propõe uma concepção “antiessencialista” de política que consiste na recusa à existência de um fundamento único, de caráter universal e de natureza permanente. Deste modo, a totalidade do social não pode mais ser compreendida como um todo harmônico, um corpo unido por um consenso substantivo no tocante às tradições, aos valores ou mesmo à sensação de representação por meio de um líder. A contribuição de Chantal Mouffe para a reflexão política contemporânea consiste em conciliar a tradição marxista, revisitando (reativando) e descostruíndo algumas de suas categorias, ao ceticismo schmittiano, o qual impossibilita o acesso a um conceito universalizável de valor, razão ou procedimento.
Para o pensador alemão Carl Schmitt, o mundo político é um “pluriverso” (SCHIMITT, 1992, p. 80.), onde a unidade política não pode, por essência, ser universal. Neste sentido, para ele, a teoria do Estado é pluralista: nenhuma doutrina pode ser aceita como a vontade de todos ou mesmo como sendo espontaneamente aceita pela maioria. Desse pressuposto cético e descritivo conclui-se, necessariamente, o imperativo de institucionalizar a indeterminação e abertura ao dissenso. Mouffe (2015) evidência no pensamento schmittiano as reflexões acerca da análise da categoria do político, trazendo à tona a reflexão do pressuposto da existência do caráter conflituoso da natureza humana na distinção schmittiana “amigo-inimigo” e na categoria “adversário”, o que possibilita a reflexão acerca do político como intrinsecamente ligado à existência de um elemento de hostilidade entre os seres humanos e, portanto, a análise dos aspectos antropológicos do conceito do político.
A violência e a animosidade são consideradas como um fenômeno arcaico que será eliminado graças ao avanço do diálogo e ao estabelecimento, por meio de um contrato social, de uma relação transparente entre indivíduos racionais. Aqueles que contestaram essa visão otimista foram automaticamente considerados inimigos da democracia. Poucas tentativas foram feitas para elaborar o projeto democrático com base numa antropologia que reconheça o caráter ambivalente da sociabilidade humana e o fato de que não se pode dissociar reciprocidade de animosidade. E, apesar daquilo que aprendemos por meio de diferentes disciplinas, a antropologia otimista ainda predomina atualmente. Por exemplo, mais de meio século depois da morte de Freud, a resistência à psicanálise na teoria política é ainda extremamente forte, e suas lições acerca do caráter inerradicável do antagonismo ainda não foram assimiladas. (MOUFFE, 2015, p. 03).
O universalismo, racionalismo e individualismo que constituem as bases da teoria liberal, os impede de enxergar a especificidade do político, assim como o papel essencial do antagonismo e poder na vida social. Mouffe (1996) estabelece uma crítica ao otimismo antropológico que atravessa as principais correntes da teoria democrática contemporânea - a liberal, comunitária e deliberativa -, enaltecendo a importância de se retomar o papel do dissenso na política, enquanto dinâmica institucional definida por um critério estabelecido; e no político, enquanto dimensão constitutiva na qual diversas identidades coletivas disputam a possibilidade de definir os termos dessa ordem. Esta refutação do otimismo antropológico implica em abandonar de uma vez por todas qualquer possibilidade de que um consenso possa ser estabelecido espontaneamente. Considerando que todo consenso é o resultado de uma relação de força, o que inclui a possibilidade de usar a violência para excluir os posicionamentos divergentes, aderir a esse postulado não pressupõe uma aceitação do status quo ou dos ditames do poder; mas, possibilita uma noção contra-hegemônica de democracia. Esse tipo de visão consensual de democracia é incapaz de reconhecer que, no domínio da política e do direito, encontramo-nos sempre no campo das relações de poder e que nenhum consenso pode ser estabelecido como resultado de um puro exercício da razão. Moufe afirma que onde se encontra o poder, não podemos eliminar completamente a força e a violência, ainda que se trate da "força da persuasão" ou da "violência simbólica" (MOUFFE, 1994, p.11). Chantal Mouffe (1994), em seu modelo agonístico de democracia, se distingue das demais correntes democráticas contemporâneas exatamente por sua insistência em evidenciar a dimensão conflituosa das relações e pela percepção de que este conflito não pode ser entendido como contingente, mas sim como algo que constitui e diferencia a esfera política. Essa caracterização agônica da democracia a distancia significativamente das demais teorias democráticas formuladas, uma vez que configura sua proposta epistemológica voltada a uma refundação da teoria política, fundamentada na preocupação com o político. Mouffe está preocupada com o fato das duras conquistas da revolução democrática serem prejudicadas por tais compreensões deficientes das origens da identidade política.
Já na introdução de sua obra Sobre o político (2015), a pensadora se propõe à análise das consequências da negação do antagonismo em diversas áreas, tanto na teoria como na política, constatando que essa recusa em admitir o antagonismo não é nova e que se pode observar que, por muito tempo, a teoria democrática girou em torno da crença em um otimismo antropológico, que defende a bondade interior e a inocência original do ser humano como condições necessárias para assegurar a viabilidade democrática (MOUFFE, 2015).
Uma parte das teorias e construções que pressupõem desta maneira o homem como “bom” é liberal e dirigida de maneira polêmica contra a interferência do Estado, [...]. Para os liberais, [...] a bondade do homem não significa nada mais do que um argumento com ajuda do qual o Estado vem a ser colocado a serviço da “sociedade”, exprime, portanto, apenas que a “sociedade” tem sua ordem em si mesma e que o Estado é apenas seu subalterno, controlado com desconfiança e mantido em limites exatos. [...] O radicalismo antiestatal cresce na mesma medida da fé na bondade radical da natureza humana. O liberalismo burguês nunca foi radical num sentido político. É óbvio, porém, que suas negações do Estado e do político, suas neutralizações, despolitizações e declarações de liberdade possuem igualmente um determinado sentido político e se dirigem politicamente, numa determinada situação, contra um determinado Estado e seu poder político. Só que estas não são propriamente uma teoria do Estado ou uma ideia política. O liberalismo decerto negou radicalmente o Estado, mas por outro lado também não encontrou nenhuma teoria positiva do Estado e nenhuma reforma própria do Estado, mas procurou, isto sim, prender o político ao ético e subordiná-lo ao econômico; ele criou uma doutrina da divisão e do equilíbrio dos “poderes”, isto é, um sistema de obstáculos e controles do Estado que não se pode designar como teoria do Estado ou princípio de construção político. (SCHMITT, 1992, p. 88)
Carl Schmitt, em sua obra O conceito do Político, aponta que desde o início o pensamento liberal colocou contra o Estado e a política a objeção da violência (SCHMITT, 1992). “O esclarecido século XVIII via diante de si uma linha clara e simples de progresso ascendente da humanidade” (SCHMITT, 1992, p.100), essa concepção liberal humanista da política traz à luz o “contrato social”, o conceito de poder “jurídico-discursivo”, a ideia de poder “legítimo”, evidenciando a imagem de uma possível sociedade pacificada o que viria a corroborar para a despolitização da política. A visão da sociedade humana induzida essencialmente pela empatia e pela reciprocidade constitui as bases do pensamento político moderno. Essa ideia de mundo pacificado representará a abolição da própria especificidade do político. Schmitt, ressalta que em toda a parte na história política, tanto externa quanto internamente, se comprova a incapacidade ou falta de vontade para fazer a diferenciação política, amigo-inimigo, o que, segundo ele, aparece como sintoma de término político. O pensador cita como exemplo alguns conflitos histórico, que claramente deveriam ter sido caracterizados pelo viés político da diferenciação amigo e inimigo, onde se evidenciou o inimigo de forma concreta, mascarados por um critério moral. Este é o caso dos Russos, onde as classes em declínio antes da Revolução romantizaram o camponês russo num mujique “bom, bravo e cristão”. Já na Europa, a burguesia relativista procurou fazer de todas as culturas exóticas inimagináveis o objeto do seu consumo estético. Momentos antes da Revolução de 1789, a sociedade aristocrática na França se vangloriava com o “homem bom por natureza” e seu povo de uma virtude comovedora. Sobre esses momentos históricos Schmitt cita a descrição de Tocqueville em seu Ancien Régime:
Tocqueville descreveu em sua apresentação do Ancien Régime (p.228) esta situação, em frases cuja tensão subterrânea provém nele mesmo de um patos especificamente político: Não se notava nada de revolução; é notável de se ver a segurança e a ignorância com que esses privilegiados falavam da bondade, benevolência e inocência do povo, quando 1793 já estava sob seus pés – “spectable ridicule et terrible” (SCHIMITT, 1992, p. 94-95).
Para Mouffe (2015), o otimismo moderno traz a crença em uma razão transcendente capaz de conceder aos homens uma moral comum, crença essa que serviu de base epistemológica para o Iluminismo. Essa visão moralista revela outra fraqueza da posição pós-política e não deve mais ser considerada como pré-condição para os desenvolvimentos políticos democráticos. Segundo Mouffe, em Sobre o Político (2015), existe uma relação direta entre o enfraquecimento da fronteira política, característica do modelo adversarial, e a “moralização” da política. Ao utilizar o termo “moralização” a pensadora ressalta que a oposição “nós-eles”, constitutiva da política, ao invés de ser construída em termos políticos está sendo estruturada no âmbito da moral através das categorias morais de “bem” versus “mal”. Essa mudança denota que a política não foi substituída pela moralidade; mas, que está acontecendo na esfera moral: hoje em dia, os antagonismos políticos estão sendo formulados em termos de categorias morais. E, ao invés de criar as condições para uma forma mais consensual de democracia, a afirmação do “fim da política adversarial” tem produzido justamente o contrário. Nos defrontamos agora com diferenças políticas do tipo “amigo-inimigo” sob a expressão da linguagem da moralidade. Como não existe consenso sem exclusão, não existe a possibilidade do estabelecimento de um “nós” sem a delimitação de um “eles”, e como nenhuma política é possível sem que se delimite uma fronteira, as diferenças agora são caracterizadas com a identidade de “nós do bem” versus “eles do mal”. Mouffe ressalta que pelo fato da política acontecer na esfera da moralidade, os antagonismos não podem assumir uma forma agonística, ou seja, não podem ser encarados como “adversários”, mas unicamente como “inimigos” considerados como a manifestação de alguma “doença moral” (MOUFFE, 2015, p. 75.). Com “eles” nenhum debate agonístico é possível, restando como opção, portanto, eliminá-los. Ao impedir a criação de uma vibrante esfera pública agonística, essa posição pós-política induz à criação de um “eles” como moral, ou seja, como “inimigos absolutos”, antagonismo esse que pode pôr em risco as instituições democráticas.
Mouffe (2000), em sua obra Democratic Paradox, diz que longe de se constituir como um alicerce necessário para a democracia, esse otimismo baseado na rejeição da negatividade inerente à sociabilidade humana é o ponto mais fraco do legado moderno. Pois, ao negar o aspecto conflituoso da relações humanas, e ao não admitir que a violência é inerradicável, ele deixa a teoria democrática inábil para lidar com a natureza do político em sua dimensão de hostilidade e antagonismo. A democracia, como já nos haviam ensinado os gregos, não é o regime da harmonia e do consenso, mas do conflito, da disputa, do agon.
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Pessimismo antropológico: o homem e sua natureza perigosa
O agon, enquanto dinâmica conflitiva entre forças opostas, quando percebido enquanto ontologia, traduz não uma natureza apenas beligerante, mas a fertilidade do universo humano na gestação dos sentidos e identidades (SILVA, 2017, p. 03). Ainda hoje, é preciso refletir acerca dos modos pelos quais os homens devem lidar com sua natureza diversa e polissêmica, cabendo o esforço reflexivo de averiguar os modos possíveis de lidar social e politicamente com o agon. Mouffe (1996) parte das reflexões schmittianas, segundo as quais o fundamento do conflito político se encontra na existência de um elemento de hostilidade entre os seres humanos, com o intuito de reconhecer a natureza necessariamente diversificada das relações sociais e compreender quais as condições de possibilidade do surgimento dos conflitos em determinados lugares do social. Ao invés de encarar o “conflito” como algo negativo a ser eliminado, é importante reconhecer, em meio à sociedade democrática, que sua natureza radical está justamente na compreensão da impossibilidade da erradicação do antagonismo.
Mouffe (1994) se apropria da concepção Schmittiana de mundo enquanto pluriversum e de sua proposta de atenuar o potencial destrutivo da inimizade, compreendida enquanto instância criadora trans-histórica, que colabora para sua recuperação do agon, visto como um conceito que remete a uma disputa, não mais entre os “inimigos” schmittianos, mas que se refere especificamente ao embate entre adversários que se reconhecem reciprocamente enquanto oponentes legítimos. É um embate que se trava contra a força de um sentido, de um logos. Assim, para haver contradição entre sentidos é preciso haver alteridade, pois sem o outro não há contrassensos. O objetivo, portanto, é transformar o antagonismo, inerente ao pluriversum das identidades políticas, em agonismo. Para o pensador alemão Carl Schmitt (1992), a política é inevitável e indestrutível, e existiria mesmo com o desaparecimento do Estado, o que permite a reflexão acerca da existência de uma matriz antropológica-existencial que consista de base para o político, na qual a análise do estado de natureza humana terá um papel relevante, destacando-se especificamente o postulado da natureza perigosa do homem como uma hipótese antropológica. É possível constatar na filosofia política de Schmitt uma forte influência da filosofia de Thomas Hobbes: na própria concepção “pessimista” do homem de sua natureza perigosa baseada na ideia do bellum de todos contra todos e na convicção de que o conflito entre os homens tem a ver com a noção de posse do bem e do justo que os indivíduos creditam para si. Segundo Schmitt, estes princípios constituem “pressuposições elementares de um sistema teórico especificamente político” (SCHMITT, 1992, p. 92).
Maria Isabel Limongi (2002), em sua obra Hobbes, especificamente no capítulo sobre O estado de guerra e as paixões naturais do homem, levanta o questionamento acerca de onde advém as bases dessa ideia do pensamento hobbesiano, acerca da condição natural do homem como uma condição de guerra de todos contra todos. Segundo Limongi, o estado de guerra é, nos termos de Hobbes, uma inferência que se pode fazer a partir das paixões humanas. Segundo o pensador, agimos no sentido da guerra à medida que certas paixões estão no princípio de nosso comportamento belicoso. Desse modo, é preciso analisá-las para saber o que nos leva a experimentar tais paixões que, por sua vez, conduzem à guerra, para entender porque a condição natural da humanidade é uma condição belicosa.
A circunstância que explica nossas paixões e nosso comportamento natural é, segundo Hobbes, a igualdade natural entre os homens. [...] sempre que os homens desejarem um objeto que não possa ser desfrutado em conjunto, eles se tornarão inimigos, disputando por tal objeto. [...] O que ele quer dizer é que a inimizade e a disputa são comportamentos que se pode razoavelmente esperar dos homens em certas circunstâncias, ou seja, que este comportamento é justificável e que podemos esperar que ele possa ocorrer numa situação de igualdade.
Dessa razoável disputa, segue-se ser também razoável desconfiarmos dos outros homens. Isto é, a desconfiança é uma paixão que se explica pela circunstância de uma possível disputa. E da desconfiança, justifica-se o comportamento de nos anteciparmos ao eventual ataque que possamos sofrer, garantindo-nos com todos os meios disponíveis contra ele.
[...] Há ainda uma terceira, talvez mais importante do que as primeiras – a glória, o fato de os homens estarem em constante disputa pela honra e pela reputação. [...] O que Hobbes quer indicar é que uma sociedade cuja ordem é montada em torno de valores da honra e da reputação é uma sociedade em estado de guerra iminente, isto é, uma sociedade sem estabilidade política. (LIMONGI, 2002, pp. 21-24)
Limongi (2002) esclarece que o pensamento Hobbesiano não estabelece que, por natureza, estamos condenados a estar sempre em guerra; mas, que nossa condição natural é tal qual a condição de igualdade e poder. Deste modo, a guerra sempre permanece como possibilidade no horizonte das relações entre os homens e sempre que surgir a possibilidade haverá disputa. Esse motivo justifica o comportamento efetivo dos homens de sempre estarem propensos a fomentar uma situação de disputa. A guerra, então, é pressuposta a partir das paixões, mas não como consequência de um mal inscrito na natureza humana. O comportamento bélico é justificável dadas as condições naturais da existência humana, ou seja, sob o viés de que os homens são plenamente iguais, nenhum poder, nenhuma instância de decisão capaz de ordenar a vida política e social, pode se instituir naturalmente de maneira a garantir uma sociabilidade pra sempre estável. Com sua teoria do estado de guerra, Hobbes evidencia que nem o consenso nem a submissão a um poder de fato, embora possam se produzir, são suficientes para retirar os homens de uma situação de guerra iminente, conferindo estabilidade à ordem social.
A análise do caráter conflituoso da natureza humana hobbesiana e a sua necessária conexão com o político tem repercussão direta na lógica de constituição do mando político. Ao constatar que a situação de guerra é uma situação de miséria e incerteza, pressupõe-se que é preciso então um poder, não natural, no qual os homens se comprometam reciprocamente a submeter suas vontades à vontade de um homem ou assembleias de homens, que passam a ter poder para decidir acerca de todos os assuntos, instituindo-se desse modo o Estado. Essa mútua relação entre proteção e obediência constitui o alicerce da filosofia política hobbesiana presente na teoria política de Carl Schmitt, mas o que mais aproxima Schmitt de Hobbes é a correlação que ambos estabelecem entre a segurança que o poder do Estado pode fornecer ao cidadão e a obediência que estes, em contrapartida, prestam ao Estado. Para Schmitt (1992), a realidade da política se impõe devido à necessidade que o homem tem de segurança, já que sua natureza conflituosa não desaparece com a constituição do político. O poder político Estatal se constituirá, então, como a única instância que pode oferecer proteção aos indivíduos, face à potencialmente perigosa relação antitética entre os homens.
Hobbes tirou, com mais clareza do que todos os outros, estas consequências simples do pensamento político, com grande firmeza, e sempre voltou a acentuar que a soberania do direito significa apenas a soberania dos homens que estabelecem e aplicam as normas jurídicas, e que o império de uma “ordem superior” é um palavrório vazio se não tem o sentido político de que determinados homens querem dominar, apoiados numa ordem superior, sobre homens de uma “ordem inferior”. O pensamento político é aqui, na autonomia e na coerência de sua esfera, absolutamente irrefutável, pois são sempre grupos humanos concretos que em, nome do “direito” ou da “humanidade” ou da “ordem” ou da “paz”, lutam contra outros grupos humanos concretos, e o observador de fenômenos políticos, se permanecer consequentemente no seu pensamento político, pode reconhecer até mesmo na repreensão de imoralidade e de cinismo, sempre de novo apenas meios políticos de homens concretos em luta. (SCHMITT, 1992, p. 93)
Mouffe (1996) enaltece que é preciso reconhecer que esse “estado de natureza”, na sua dimensão hobbesiana, nunca pode ser completamente erradicado, mas apenas ser mantido sob controle, “sublimado”. Esse reconhecimento lança um novo olhar sobre a democracia. Considerando que esta temática das “paixões” ou dos “afetos” permeia grande parte das teorias políticas, porque não analisá-las também sob o viés dos desígnios democráticos?
Para a pensadora Chantal Mouffe (2019c), é crucial refletir acerca da dimensão afetiva da política, já que esta dimensão não racional indica a base popular de toda renovação política. A dimensão afetiva cobra um papel fundamental porque os afetos constituem as paixões coletivas e podem ser mobilizadas dentro de um esquema democrático. A temática da mobilização das paixões é uma das suas preocupações em sua proposta de construção de uma política contra-hegemônica. A pensadora adverte que seria trágico para a esquerda e para o futuro da democracia, “ignorar o forte investimento libidinal em ação nas formas nacionais – ou regionais – de identificação e seria muito arriscado abandonar esse terreno para o o populismo de direita” (MOUFFE, 2019c, p. 113). Mouffe enaltece então que levar em consideração a dimensão dos afetos na política requer um profundo envolvimento com a psicanálise. Mouffe (2015) enfatiza especificamente a análise psicanalítica de Freud em O Mal-Estar da Civilização, para enfatizar uma visão de sociedade em permanente ameaça de dissolução, “devido a essa hostilidade primária entre os homens a sociedade está permanentemente ameaçada de desintegração. O interesse do trabalho em comum não a manteria; paixões movidas por instintos são mais fortes que interesses ditados pela razão” (FREUD, 2010, p. 78). Portanto, uma das tarefas primordiais da política democrática consiste em refletir acerca de qual é o papel das paixões na esfera pública. A partir dessa constatação, é possível admitir que a democracia é algo incerto e improvável e nunca deve ser considerada como uma garantia, uma vez que ela é uma frágil conquista que necessita ser defendida e aprofundada. Longe de ser resultado de uma evolução moral da humanidade, ela se encontra em perigo quando o consenso e a fidelidade a seus valores são insuficientes e também quando a sua dinâmica combativa é travada por um aparente excesso de consenso, o que em realidade mascara uma apatia inquietante.
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Paixões e Identidades Coletivas
O político, [...] tanto contém a possibilidade de paz (a amizade), como a possibilidade real de guerra (a inimizade). Daí que Schmitt afirme, de forma particularmente radical [...], que “se sobre a terra não houvesse mais que neutralidade, não só teria terminado a guerra, mas também a neutralidade em si mesma, de igual forma que desapareceria qualquer política, incluindo a de evitar a luta, se deixasse de existir uma luta em geral” (PEREIRA, 2014, pp. 47.55).
[...] no campo da política, o que encontramos são grupos e identidades coletivas, e não indivíduos isolados, o que significa que a sua dinâmica não pode ser apreendida pela redução a cálculos individuais. Isto tem consequências devastadoras na abordagem liberal, uma vez que tal como ensina Freud, se o benefício próprio pode, em certas circunstancias, ser uma motivação importante para o indivíduo isolado, só muito raramente determina a conduta dos grupos. Não se trata necessariamente de apoiar inteiramente a concepção do político de Schmitt, mas sim de ceder à força de seus argumentos quando expõe os defeitos de uma concepção que apresenta a política como um domínio neutro e isolado de todas as questões controversas que existem no domínio privado. [...] Negar o político não o faz desaparecer, apenas conduz ao espanto no seu tratamento. (MOUFFE, 1996, pp.186-187)
Para Mouffe (1996), os homens são constantemente dominados por suas paixões e por jogos de interesses, o que os impossibilita de se comportarem apenas dentro de padrões puramente racionais e razoáveis de conduta, muitas vezes ultrapassando as fronteiras do espaço privado e atingindo a esfera pública. Essas paixões podem irromper violentamente como conflitos inerradicáveis, não podendo ser contidas e reduzidas dentro dos limites de um consenso formal e abstrato quanto às regras e aos procedimentos obtidos através da argumentação e deliberação na esfera pública. Elas precisam ser levadas em consideração quando se discute o viés político democrático, com o intuito de compreender o papel desempenhado por essas paixões no âmbito do processo democrático.
Freud (2010) caracteriza a evolução da civilização através da luta entre dois instintos libidinais: Eros, o instinto da vida, e Tânatos, o instinto da agressividade e da destruição. Os dois tipos de instinto nunca aparecem isolados um do outro, mas mesclados entre si. Não sendo possível, portanto, eliminar o instinto agressivo, é possível e mesmo preciso tentar desarmá-lo, enfraquecendo seu potencial destrutivo através da sublimação. Sob o viés da teoria política agonista, as instituições democráticas podem contribuir para desarmar as forças libidinais que conduzem à animosidade, sempre presente nas sociedades humanas, através da criação de uma representação conflituosa do mundo, com campos opostos com os quais as pessoas possam se identificar para agir politicamente, tornando-as capazes de se identificar com uma identidade coletiva que ofereça uma ideia de pertencimento e que possibilite compreender o contexto em que estão inseridas no presente, lhes dandoesperança para o futuro. Para Mouffe (2019c), a política democrática precisa considerar a dimensão afetiva das relações, ter uma ascendência real sobre os desejos e fantasias das pessoas. Em vez de opor interesses a sentimentos e razão a paixões, ela deve oferecer formas de identificações que contribuam para as práticas democráticas. Ao enfatizar apenas o cálculo racional de interesses ou a deliberação moral, a teoria política democrática atual é incapaz de reconhecer o papel das “paixões” como uma das forças motrizes do campo da política, ficando desse modo impotente diante de suas irrupções e manifestações.
Outra crítica feita por Chantal é quanto ao processo de esvaziamento do indivíduo de suas características essenciais. Nas teorias deliberativas, o cidadão é despido de suas particularidades, de sua linguagem, de sua história e da sua cultura, tornando-se assim um modelo padronizado, um indivíduo racional, universal, portador de direitos individuais, autêntico representante de uma totalidade. Ela deseja romper com qualquer forma de essencialismo, propondo uma desuniversalização dos sujeitos políticos. Na pós- modernidade, o elemento social é fragmentado, o sujeito não é um só, mas vários. Assim, cabe a um novo conceito de cidadania - cidadania radical -, funcionar como o elemento articulador entre estas diferentes posições de sujeito, formando identidades coletivas, buscando uma equivalência democrática entre as diversas lutas sociais. (KOZICKI, 2004, p. 342)
Em sua obra O retorno do político, Mouffe (1996) traz à tona indagações acerca da natureza dos novos antagonismos e, com efeito, questiona de que forma podemos compreender essa natureza antagônica se ainda temos como base a imagem de um sujeito unitário como fonte única de inteligibilidade das ações, e, além disso, como seria possível apreender a multiplicidade das relações de subordinação que afetam os indivíduos se ainda encaramos os agentes sociais como entidades homogêneas e unificadas? Segundo Mouffe (1996), a multiplicidade de posições de sujeito é a característica principal que caracteriza as lutas de novos movimentos sociais, o que constitui ao mesmo tempo a possibilidade de que um só agente e a multiplicidade se transformem em focos de antagonismo, e deste modo possam ser politizados. Para pensar politicamente o hoje e compreender a real natureza das novas lutas e da diversidade das relações sociais, é preciso considerar como ponto de partida uma teoria do sujeito como um agente descentrado e não total, “um sujeito construído no ponto de intersecção de uma multiplicidade de posições subjetivas, entre as quais não existe uma prioridade ou relação necessária e cuja articulação é o resultado de práticas hegemônicas” (MOUFFE, 1996, p. 26). Ou seja, nenhuma identidade é definitivamente estabelecida. Há, portanto, sempre um certo grau de abertura e de ambiguidade na forma como as diferentes posições de sujeitos são articuladas. Diante de novas perspectivas de ações políticas, é necessário, segundo a autora, reconhecer a dimensão do político, que é justamente essa dimensão de antagonismo, como própria de uma sociedade que está sempre dividida – algo que nem o liberalismo com o seu “indivíduo de interesse”, nem o marxismo com a sua redução de todas as posições subjetivas à posição de classe puderam mensurar. Os novos direitos hoje reivindicados são expressões dessas diferenças que só agora começaram a ser afirmadas. A democracia radical de Mouffe exige, portanto, que se reconheça a diferença entre o particular, o múltiplo e o heterogêneo. É preciso rever até mesmo a categoria de “indivíduo” como categoria universal e que se aplica a todos e a qualquer um, quando na verdade “indivíduo” se refere ao conceito abstrato “homem”, e é necessário, então, um novo tipo de articulação entre o universal e o particular.
A pensadora política Chantal Mouffe (2017) afirma que uma democracia voltada para o consenso racional é uma democracia enfraquecida, onde culmina o desinteresse dos indivíduos para com a vida política, como pode ser visto em muitas sociedades democráticas liberais contemporâneas, nas quais a política se tornou um mero jogo racional de consenso entre interesses divergentes, levando a sociedade a um constante processo de esvaziamento da esfera política. Os modelos dominantes de democracia não estão preparados para lidar com as transformações causadas pelo advento da globalização, uma vez que ainda ignoram e se recusam a compreender o processo de construção de identidades políticas coletivas e pluralidade de relações sociais que caracterizam a sociedade contemporânea. Considerando que a essência do debate político-democrático é o conflito de ideias, ou seja, o embate entre diferentes ideologias, possibilitando, deste modo, a escolha entre projetos diferentes – sejam eles neoliberais, democratas sociais ou democratas radicais –, segundo Mouffe (2017), lidamos agora com instituições “democráticas” que giram em torno do vazio na medida em que a dimensão da “soberania do povo” (demos + kratos) está hoje completamente eliminada, apesar de estarmos inseridos em sociedades que se afirmam como democráticas. Ao cidadão já não há a possibilidade de intervir, não se tem mais a oportunidade de escolha e de expressão das vozes, já que as eleições consistem na maioria dos casos em escolher entre propostas políticas praticamente equivalentes, de consenso ao centro característico da pós-política, ou centro-direita ou centro-esquerda e que, no fundo, representam o mesmo viés ideológico.
“A pós-democracia pode também ser caracterizada com uma dimensão econômica, como a oligarquização da sociedade europeia, com o fato de ter havido nas últimas décadas um aumento exponencial das desigualdades, com o abandonar de todo o projeto de igualdade de redistribuição. A pós-democracia tem portanto dois aspectos: um, propriamente político, que consiste em já não haver diferenças entre a esquerda e a direita; e outro de carácter econômico” (MOUFFE, 2017, §6).
Seria necessário portanto, para estimular os indivíduos a participar da vida política, uma esfera vibrante de contestação: a esfera pública não pode ser racionalizada, mas deve ser apaixonante, pois para funcionar a democracia exige que haja um choque entre posições políticas democráticas legítimas, e assim deveria se dar o confronto entre esquerda e direita. Esse confronto possibilita oferecer formas coletivas de identificações suficientemente fortes para mobilizar as paixões políticas. Nesse sentido, o conflito desempenha um papel integrativo na democracia.
Ao defender, em sua concepção agonística da política, a mobilização dos “afectos comuns”, das “paixões”, a autora não estaria introduzindo na razão política o que é contrário a ela? Pode-se considerar democrático exigir dos cidadãos que mobilizem seus sentimentos e paixões? Em Sobre o Político (2015) , a pensadora destaca que mesmo privilegiando o individualismo e proclamando o fim das identidades coletivas, não há como ignorar as paixões e eliminar desse modo a dimensão afetiva da política (MOUFFE, 2015). Ela permanece presente e a carência gerada pela falta de identificação provavelmente seria suprida por outras maneiras, como tem claramente se evidenciado nas sociedades contemporâneas através do discurso “populista de direita”, que está substituindo a oposição esquerda-direita pelo surgimento de identidades coletivas hostis ao tratamento democrático, estabelecendo fronteiras como os “democratas do bem” que surgem em defesa dos valores tradicionais, mobilizando pessoas racistas, sexistas, etc. em torno de um populismo de direita. Por outro lado, muitas pessoas sentem-se bem e virtuosas simplesmente por participarem da denúncia das “forças nocivas”, assumindo deste modo uma contraposição moral, mobilizando também certas paixões contra o que foi denominado “extrema direita”, utilizando-se do repertório tradicional do discurso antifascista. Em entrevista concedida ao jornal Página/12, e embora o eixo do seu pensamento seja a Europa Ocidental, Mouffe se refere à Argentina e ao caso do Brasil, diferenciando o populismo de direita do fascismo.
Por exemplo, atualmente, e não falo apenas a nível europeu, mas pensando na América Latina, há apenas uma pessoa que merece o título de fascista e é (Jair) Bolsonaro. O projeto de Bolsonaro é claramente um projeto que coloca em questão o Estado de Direito e as instituições da democracia pluralista. [...] É perigoso, porque diante do fascismo, a única coisa que você pode fazer nesse caso é proteger-se, estabelecer um cordão sanitário para impedi-lo. Então, em primeiro lugar, você não vai entender o que está acontecendo, a razão pela qual as pessoas estão votando nesses partidos. E então não vai entender como impedir que cresçam. Parece-me que é totalmente contraproducente. (MOUFFE, 2018, § 8)
Romano (2018), em “Paixão e razão”, utilizando categorias propostas pelos pensadores Ernesto Laclau e Chantal Mouffe na obra Hegemonia e estratégia socialista como referencial – categorias como de “significantes vazios”, “cadeias de equivalência” e “fronteiras políticas”, que demarcam a luta antagônica pela hegemonia que se expressa na disputa entre discursos políticos – propõe olhar as eleições do Brasil de 2018 com o intuito de analisar os discursos políticos das principais candidaturas (Marina, Lula, Alckmin, Ciro, Boulos, Haddad e Bolsonaro), considerando o processo eleitoral como um momento da disputa hegemônica que vem se travando no país. Para a análise do discurso das candidaturas, o autor trouxe um conjunto significativo de falas, discursos registrados em eventos públicos como comícios, caravanas, entrevistas, anúncios televisivos, declarações à imprensa, mensagens e postagens nas mídias sociais, feitos ou expressos desde o segundo semestre de 2017 até outubro de 2018, com o intuito de destacar os componentes estratégicos e emocionais que as candidaturas promoveram em sua prática discursiva. Ele mostra, assim, a relevância do apelo emocional ou moral das práticas discursivas, as quais, ignorando o ponto de vista racional das propostas políticas dos candidatos, passam a ter sentido como mecanismos estratégicos de reconstrução da sociedade e dos sujeitos. Segundo Laclau e Mouffe (2015), toda identidade se constitui pela diferença, é relacional, demarca uma exclusão e demanda um outro como seu “exterior constitutivo”. Nesse sentido, o que confere identidade a um discurso político é a estruturação de um “outro” em oposição ao qual se afirma. Para a autora, 3é através da oposição, da negação e do conflito, que sempre envolve o elemento passional em que se estruturam um “nós” e um “eles”, e que uma cadeia de equivalência entre diferentes demandas se torna possível, ressaltando desse modo a impossibilidade de haver qualquer “acordo de vontades” ou algo como um mínimo denominador comum, ou qualquer consenso entre sujeitos iguais e esclarecidos que argumentam segundo a razão.
No discurso político de Jair Messias Bolsonaro, homem, branco [...] se auto–define por possuir posições em defesa da família, da soberania nacional, do direito à propriedade e dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa. [...] Para os seus críticos, o destaque obtido por Bolsonaro é fruto do contexto onde medo, ressentimento e raiva são estimulados, e os preconceitos e as posturas antirrepublicanas emergem, fertilizando o terreno para a propagação do fascismo. [...] o discurso delimita o “nós” cidadãos de bem articulado a segurança e moral, defesa da família, valores cristãos conservadores, escola sem partido; redução da maioridade penal e controle da natalidade; homens que valorizam as armas, a polícia e os militares, e que preferem as milícias às drogas; proprietários que defendem a livre iniciativa, e em particular proprietários rurais e agronegócio que necessitam de segurança no campo. [...] Em síntese, o “nós” está conformado pelos verdadeiros patriotas. É no âmbito da dimensão moral que se deve perseguir o objetivo político de mobilizar – e armar – os cidadãos de bem e construir uma nova ordem.
No sentido inverso, “eles”, esquerdistas é também um significante vazio que está associado a bandidagem, imoralidade e corrupção. Através da cadeia de equivalências, esquerdista como principal inimigo, se desdobra em grupos sociais específicos: os gays e homossexuais; mulheres; ativistas de direitos humanos [...] indígenas, quilombolas, sem- terra e terroristas do campo; invasores da propriedade privada; movimentos sociais; comunistas; cotistas e bolsistas; refugiados; intelectuais e jornalistas; socialistas e social– democratas, doutrinadores de Paulo Freire e Gramsci. Em síntese, os anti–patriotas. (ROMANO, 2018, pp. 17-18)
Os discursos políticos mobilizados durante as eleições brasileiras caracterizam o que Chantal Mouffe (2015) descreveu na obra Sobre o político, como a política sendo conduzida no registro da moralidade, evidenciando um mecanismo perverso em funcionamento nas reações moralistas, onde o “eles” surge como “inimigos absolutos”, favorecendo assim o surgimento de antagonismos que podem pôr em risco as instituições democráticas. O contexto histórico idealizado e mobilizado pelo candidato eleito é o do golpe militar, momento de “ordem e progresso” em sua prática discursiva. Além disso, apela-se a uma condição de “mito”, líder admirado pelo povo. O tom do discurso é principalmente emocional, direto, fundado no senso comum e particularmente agressivo, sendo sua construção discursiva um processo eleitoral dominado pelo moralismo em que o “mito” representa o sentimento da família ordeira brasileira, ancorado na tradição e na propriedade. Para ele, os “inimigos” esquerdistas aniquilaram a ordem, a moral e os avanços do período militar, tornando necessária a restrição dos direitos, com freio aos movimentos sociais por meio de seu governo liberal, autoritário e disciplinador. Outro elemento definidor das eleições presidenciais de 2018, segundo Romano (2018), utilizado para exacerbação da paixão, foi o das as mídias sociais, com a emergência das redes sociais digitais, o uso intensivo de robôs e falsos perfis que culminaram na intensificação da polarização. A rede Whatsapp, por exemplo, enquanto uma rede familiar, que se estabelece basicamente através de relações de confiança, serviu para o fortalecimento de fake news e narrativas muitas vezes fundamentalistas. Suas falas e mensagens simples, diretas, fáceis de repetir, frequentemente dominadas pelas não-verdades, relativizou o peso das mídias tradicionais com seus debates e embates diretos entre candidatos, sendo esta a primeira eleição na qual o peso da TV, das mídias tradicionais e a das redes foram ofuscadas pelas redes sociais, pelo desafio das fake news, da virulência e da intolerância que se propagaram nesses meios, espaços de antagonismo e de incentivo à eliminação simbólica, física, do outro, do diferente, suprimindo as possibilidades de mediações que estabilizam o debate político. Minou-se também o conceito de representação, central para as democracias liberais, tornando ainda mais opacos os mecanismos e interesses que regem o jogo político e mais precários os resultados da disputa democrática. “Houve um esvaziamento da esfera pública” (ROMANO, 2018, p. 106).
Antagonismo e agonismo: o reequilíbrio entre paixão e razão, tendo o outro como adversário e não como inimigo. [...] no contexto do neoliberalismo, com as técnicas de poder que se manifestam nas mídias e nas redes sociais tem se exacerbado a paixão, reconfigurando a esfera pública e correndo-se o risco de conformar-se uma nova massa que, além de sua auto-exploração, procura eliminar a diferença e o outro. Ao mesmo tempo, as tendências dominantes do liberalismo, com seu racionalismo e individualismo não permitem compreender o papel central que as paixões desempenham na política. Se faz necessário um reequilíbrio entre paixão e razão. (ROMANO, 2018, p. 109)
Segundo a pensadora Chantal Mouffe (2015), na ausência da configuração adversarial, as paixões não dispõem de um mecanismo democrático de sublimação, obstruindo deste modo as dinâmicas agonísticas do pluralismo, correndo-se então o risco do confronto democrático ser substituído por confrontos morais e/ou essencialistas de identificação. Quando as fronteiras políticas se tornam indefinidas, emergem as insatisfações com os partidos políticos e a proliferação de outros tipos de identidade coletiva, que giram em torno de identificação nacionalistas, religiosas ou étnicas. Não se pode negar também que há uma dimensão populista no fascismo: Hitler e Mussolini eram populistas. Por isso, as esquerdas ainda relutam em considerar a dimensão afetiva da política. Por causa das consequências e experiências históricas dos fascismos, as forças de esquerda mantém distância das questões que envolvem a mobilização das paixões e a cristalização dos afetos, deixando o campo dos afetos disponível para as forças da direita. Essas são questões absolutamente centrais para a política. Segundo Mouffe (2019a), o desejo e a paixão não devem ser afastados como indesejáveis para a democracia; pelo contrário, são elementos que representam a sua sobrevivência. Não se pode mais ignorar a dimensão afetiva da política e fechar os olhos com relação às paixões, pois é urgente a necessidade de superação do consenso neoliberal e o enfrentamento do “populismo de direita”, já que para Mouffe (2019a) a única maneira de lutar contra um afeto é construir outro afeto mais forte. O populismo deve significar a mobilização das paixões do povo no sentido de uma radicalização da democracia. Portanto, a questão essencial para a autora é como estabelecer essa distinção entre “nós” e “eles” – que é constitutiva do político – de forma compatível com o reconhecimento do pluralismo.
Toda concepção religiosa, moral, econômica, étnica ou outra transforma-se numa contraposição política, se tiver força suficiente para agrupar objetivamente os homens em amigos e inimigos. O político não reside na luta em si, que por sua vez tem suas próprias leis técnicas, psicológicas e militares, mas, conforme já dissemos, num comportamento determinado por esta possibilidade real, num claro reconhecimento da própria situação por ela determinada e na tarefa de distinguir claramente entre amigo e inimigo. (SCHMITT, 1992, p. 63).
S egundo Carl Schmitt (1992), o individualismo e o racionalismo que caracterizam o pensamento liberal dominante excluem a compreensão da natureza das identidades políticas por não reconhecer a sua dimensão antagônica enquanto essência do político, inerente a todas as sociedades humanas. A obra de Schmitt O Conceito do Político (1992) traz a visão de um mundo polarizado, de um mundo em que a política é cada vez mais neutralizada pela economia e pelos mercados, tornando-a um dos vestígios mais fidedignos deste século de amizades e inimizades extremadas, o que justifica em grande parte a relevância da sua obra e o motivo de ter se tornado, nas últimas décadas do século XX e no conturbado início do século XXI, uma obra de referência do pensamento político para autores tão diversos como Leo Strauss, Jacques Derrida, Giorgio Agamben, Antonio Negri, Slavoj Žižek e Chantal Mouffe. Desde sua obra O retorno do político (1993) até o presente, os trabalhos de Mouffe têm refletido acerca de uma perspectiva "antiessencialista" da política, sobre a especificidade do político e da inerradicabilidade do poder e do antagonismo. Neste sentido, a figura de Carl Schmitt desempenhou papel central em suas reflexões. A autora enfatiza que é preciso considerar a dimensão de antagonismo evocada pela oposição amigo-inimigo, que revela a relação de identidade ou conflito que subjaz às formas de agrupamento ou de oposições entre os homens, no domínio político, já que elas se caracterizam por corresponderem ao grau máximo de intensidade possível de união ou de separação, revelando a possibilidade real dessas relações de identidade amigo-inimigo terem como horizonte uma guerra civil.
Segundo Carl Schmitt (1992), os conceitos de “amigo-inimigo” e luta adquirem o seu sentido real precisamente por fazerem referência à possibilidade real de eliminação física. Mas é relevante destacar que essa possibilidade real de ameaça existencial não se traduz numa ideia de conflito constante. Ainda na perspectiva do autor, a guerra não precisa acontecer, não há uma idealização do conflito armado, a política não tem que se materializar constantemente em guerra, uma vez que basta a permanente possibilidade real desta. Em sua definição do político, a distinção entre amigo e inimigo “não é belicista”, mas ao mesmo tempo não se pode afirmar que é pacifista.
[...] ¿cómo se traducen o canalizan los antagonismos en agonismo? ¿Cómo tramita el agonismo la asimilación de la violencia? El problema es serio, porque siempre existe el peligro potencial de que el antagonismo se transforme y descargue, que se convierta en conflicto extremo. Como vemos, el problema que nos ocupa es el de la gestión o tramitación de la violencia por parte del agonismo mouffeano. (COHEN, 2019, p. 51)
O horizonte bélico schmittiano, cujo antagonismo pressupõe a eliminação do inimigo, é o ponto de distanciamento de Mouffe em relação a Schmitt, pois a pensadora não concorda que essa seja a única maneira de pôr em cena o desacordo. Por isso faz-se necessário pensar “com Schmitt e contra Schmitt”, pois o que uma política democrática liberal e pluralista requer é que os outros não sejam percebidos como inimigos a serem destruídos; mas, como adversários, cujas ideias podem ser combatidas até de forma passional, sem que seu direito à defesa dessas ideias seja questionado. O próprio significado do termo “agonismo” remete a tudo que inspira ou pressupõe um espírito combativo, beligerante ou contraditório, cujapresença do antagonista, do adversário, é necessária para o Agon, a “luta”, continuar revelando um terreno simbólico partilhado, e diz mais a respeito de um embate contra uma razão estabelecida, a oposição de um logos a outro, um conflito contra a força de um sentido ideológico, do que o face a face schmittiano. Os limites do pluralismo estão relacionados com o fato de alguns modos de vida e alguns valores serem por definição incompatíveis com outros, sendo exatamente esta exclusão que os constitui. Mouffe enaltece que devemos tomar a sério a ideia de Nietzsche de uma “guerra dos deuses” (MOUFFE, 1996, p.171.) e para que a luta agônica entre os deuses perdure é preciso que os lutadores nunca cheguem a um acordo de paz. Por outro lado, é preciso assegurar que nenhum deles seja aniquilado pelo outro, já que para que ocorra a luta é preciso que existam antagonistas. Nessa luta inevitável e sem trégua, que não pode implicar a destruição dos beligerantes, está em jogo o caráter agonístico.
A democracia, desde os gregos, não é definitivamente o regime da harmonia e do consenso; mas, do conflito, da disputa e do “Agon”. Hoje, em meio a uma época assolada por inúmeros conflitos, não se pode aqui fazer apologia à violência, ao ódio, à desqualificação gratuita do outro, muito menos mascarar o aspecto antagônico das relações sociais com uma possibilidade ilusória de consenso. É preciso se debruçar seriamente sobre a questão e reconhecer que uma sociedade pluralista não nega a existência dos conflitos, é preciso reconhecer tanto no campo do “político”, no plano teórico, que há antagonismos, que a sociedade está dividida, quanto no campo da “política”, no conjunto de práticas, de “jogos de linguagem”. É necessário, no campo das decisões institucionais, refletir sobre o modo de organizar a coexistência humana sob as condições dos conflitos nunca resolvidos, é preciso haver diversas transformações econômicas e políticas com consequências radicais dentro das instituições democráticas, permitindo assim que as paixões sejam mobilizadas no âmbito do processo democrático, considerando que a dimensão adversarial é sua própria dinâmica e possibilidade de existência. Portanto, Mouffe (2019c) se levanta em defesa de que é possível pensar uma ordem democrática, mesmo partindo de uma concepção do político como antagonismo, defendendo que a oposição entre um “nós” e um “eles” não precisa ser estabelecida em torno de um “inimigo” que é preciso destruir ou erradicar, mas em torno de um adversário que tem o direito de defender pontos de vista diferentes, sendo a agonística a maneira de pôr esse conflito em cena. Também é fundamental pensar a constituição de um “nós”, a constituição de um demos, um povo, e re-significar de maneira positiva a palavra “populismo” para lutar contra as democracias sem povo.
REFERÊNCIAS
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